segunda-feira, 9 de maio de 2011

O bar não está a venda


por Catharine Malfatti

O bar não está a venda.

E nem poderia estar.
Podemos vender uma casa, mas nunca um lar. Este é feito de pessoas, pessoas da família, pessoas que visitam este lar, é feito de pessoas que semprre voltam e algumas que não podem voltar.
Este lar é feito com amor, amor em cada parede pintada, cada martelada na madeira, que um dia foi só madeira, com amor dado em cada pincelada de cor nesses quadros. Você pode encontrá-lo até no tecido das cadeiras, no tempero da comida e no tom afinado desses violões e toda sorte de instrumentos...
O lar é uma alma. A alma de uma casa.
A alma dessa casa é complexa, sabe-se lá quantas pessoas passaram por aqui e, todas elas, deixaram uma centelha de sua própria alma:
Muitas vezes num sussurro cantado de uma música, na risada alta de uma alegria inesperada, no choro abafado de um desabafo, nos pensamentos secretos e solitários, nos objetos trazidos de presente, nos beijos de todos os casais apaixonados ou apenas embriagados de uma paixão efêmera, na voz ansiosa de um músico solitário, no trabalho contente de todos os funcionários, numa lembrança contada com ressaca no domingo...
Ahhh! Quantos pedacinhos de alma habitam este lar.
Amigos, este bar não pode estar a venda!
Somos todos acionistas dessa grande alma que é o Espelunka.
Enquanto não houver uma bolsa de valores de alma, um leilão de amor dado, o bar não está a venda!
Simples assim, tão difícil assim.
Mas foi na simplicidade que este bar cresceu, cresceu como um menino livre, desses que andam sem mãe pela rua, e seu pé é sujo do barro do chão, não tem preconceito, não conhece limites e vive para o mundo. E como todo menino livre que não tem amarras no peito, vai-se embora.
Às vezes deixa um bilhete, quase sempre deixa nada, e sempre deixa muita saudade.
Difícil assim!
Como diz Seo Frederico, esse bar é feito de nossa energia, e energia não se dissipa, não se desfaz...
Energia se transforma!
Não sabemos para onde vai este bar, e se vai. E se outro Espelunka abre as portas em qualquer outro lugar desse mundão... não será o mesmo. Porque esse Espelunka, que por nove anos viveu numa praça desacreditada do centro de São Vicente, este Espelunka - que hoje velamos com cachaça, música e lágrimas - se transformará, em energia que habitará a partir de hoje somente em nossos corações. Seu endereço agora será a lembrança de cada um de nós.
Obrigada!
Obrigada primeiramente a todos os clientes (amigos), pela fidelidade e tanto carinho!
Foi quase que surpreendente saber o quanto este bar é importante para todos vocês, e saber disso nos conforta nessa dor.
Obrigada a todos os músicos, sem nenhuma exceção ou distinção de sua música, TODOS!
Músicos que aprenderam amar este bar e sua família e fizeram daqui parte de seu lar!
Sucesso a todos!
O caminho é árduo, mas sempre será belo e todos precisamos de suas notas para encantar nossa alma!
Obrigada aos tantos funcionários que ajudaram a fazer deste bar um lar, com seu trabalho, carinho e dedicação!
Um agradecimento especial à Maria, por sua fé e lealdade e seu constante sorriso.
Obrigada a todos os espíritos que guardam e passeiam por este bar. Com permisão falo para eles, falo com muito respeito a eles, e a todas as crenças, agradecemos a presença etérea e a Luz!
Ahhh... amigos, não se surpreendam! Este lar é feito também do que não podemos ver e compreender!
E agora já envolvida por uma emoção lancinante, agradeço ao Frederico, Cleide - e com saudade ao Cleber. Que acreditaram, que se permitiram sonhar e, com tantas percalços pelo caminho, fizeram desse bar uma referência, e o tornaram um lar.
Que com muito amor receberam todos com alegria, mesmo quando era quase impossível, mesmo nas muitas vezes que o cansaço do corpo e da alma castigavam, não deixaram a cortina cair, e permitiram que o Show continuasse.
Agora, desejo muita força. Lembrem a todo momento do tamanho imenso da coragem e da Fé que vocês possuem!
E muito obrigada por não colocarem nosso Bar a venda!
Obrigada Espelunka.


* Este texto foi lido no palco do Espelunka na noite de trinta de abril do ano de dois mil e onze, por Ana Carolina Moreira.


Um comentário:

  1. Lindo texto, Catharine. Silenciou o Espelunka, extraiu suspiros, lembranças,sorrisos e lágrimas. Beijos a todos da família Malfatti...já estou com saudades!

    Merry

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